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sábado, 19 de março de 2016

POEMA EM QUE CITO A AÇÃO

Por Danilo Cerqueira*


Neste poema, em que cito a ação
não está fundada a hipoesia
antes fosse, abancada, séria
ensimesmada, a justiça poética... corrigida

De peito a seio, visaste, vibraste a pauta!
Seres e coisas, animais e sobrenaturais
elevam cantos e ordens...
sobre ondas e ares...
saboreiam-se as fervescências
as ideias pequenas, o entalo na língua...

- Aonde foram os ventos vocais?
- Onde fica o conhecimento!
- Até quando a mente se emuda, aninhando
a ida e a ira entre a mentira e a lamúria?...
Ó, poesia inútil e instrumento per-verso
Queixume saboroso, de ilibado a ilusório
Martelo e espanador... moeda em pé!

19/03/2016


* Danilo Cerqueira é licenciado em Letras Vernáculas (2010), além de especialista (2012) e mestre (2014) em Estudos Literários, todas graduações pela UEFS. É revisor, professor e membro do conselho editorial da revista Graduando: entre o ser e o saber.

sexta-feira, 11 de março de 2016

OSWALD DE ANDRADE E O MANIFESTO PAU-BRASIL

Por Maria Rosane Vale Noronha Desidério*


“A poesia começa nos fatos.” Esta foi a primeira frase do manifesto Pau-Brasil. Oswald de Andrade já começa o seu texto com uma grande defesa do modernismo. Era preciso falar das coisas que estavam ali, ao redor de todos. Era preciso falar do cotidiano, falar das coisas próprias, genuínas do Brasil.

O manifesto Pau-Brasil foi lançado em 1924 por Oswald de Andrade, o grande agitador do movimento, mas também um grande revolucionário, que pregou, com seu manifesto, o fim dos arcaísmos e da erudição na língua brasileira. Ele disse: “A língua sem arcaísmos, sem erudição. Natural e neológica. A contradição milionária de todos os erros. Como falamos. Como somos.” Isso mostra uma característica do movimento modernista, a busca por uma língua nacional. A língua falada nas praças, nos bares, nas casas. Porque esta era de fato a língua que representava a brasilidade. Essa defesa pelo falar genuinamente brasileiro pode ser observada no seu poema Pronominais. Vejamos: “Dê-me um cigarro/ Diz a gramática/ Do professor e do aluno/ E do mulato sabido/ Mas o bom negro e o bom branco/ Da Nação Brasileira/ Dizem todos os dias/ Deixa disso camarada/ Me dá um cigarro.” Aqui fica claro a defesa por um português brasileiro, livre da erudição, dos arcaísmos, que já não se percebiam mais na comunicação habitual das ruas, da vida cotidiana.

Oswald buscava uma poesia que expressasse o Brasil presente, que pudesse captar o cotidiano. E para isso era preciso vencer as resistências acadêmicas dos intelectuais que teimavam em não mudar. A arte precisava ser modernizada, mas sempre havia a rigidez atroz da Academia Brasileira de Letras. Oswald desejava que as novas ideias pudessem encontrar espaço no meio de tanto retrocesso cultural. E que finalmente a poesia encontrasse sua liberdade. Uma liberdade aprisionada pela rigidez da forma e da estética.

No manifesto, Oswald diz: “Só não inventou uma máquina de fazer versos – já havia o poeta parnasiano.” É nesse estilo provocador que o poeta demonstra o desejo de salvar a poesia desse estado estático e preso à métrica parnasiana. A impressão que se tem é que o estilo parnasiano lança a poesia em um estado quase industrial. Como se cada verso parnasiano fosse levado a uma máquina, colocado em uma forma, e então, saísse pronto, semelhante a uma mercadoria encomendada. Oswald queria liberdade.

As vanguardas europeias muito influenciavam o poeta. Ao chegar da Europa, Oswald concluiu que seu país estava a anos-luz atrasado no que se referia à arte. A semana de 22 arrasou a São Paulo intelectual. Foram três dias destruidores. E, efetivamente, essa era a necessidade inicial, uma ruptura com o passado para criar a modernidade nas artes, na literatura.

O manifesto Pau-Brasil foi uma consequência da semana de 22. Depois, Oswald trouxe o manifesto Antropofágico, um desdobramento do Pau-Brasil, e ao mesmo tempo uma resposta ao Verde Amarelo e Grupo da Anta, de Plínio Salgado e seus amigos.

Nas palavras de Oswald: “O contrapeso da originalidade nativa para inutilizar a adesão acadêmica.” Era preciso abandonar o academismo, mergulhar na natureza brasileira, encontrar sua identidade, revisitar o nativo, experimentar novas estéticas, falar do cotidiano. Era preciso uma ruptura definitiva com o passado. Isso, para aquela época, era uma grande orgia intelectual, uma revolução. Mário de Andrade, amigo e também participante ativo do movimento – aliás, um dos maiores nomes da primeira fase –, disse, acerca da primeira década do modernismo no Brasil, que “vivemos uns oito anos, até perto de 1930, na maior orgia intelectual que a história artística do país registra.”

Apesar do movimento modernista ter sido recebido de maneira extremamente hostil, durante a semana de 22, ele atingiu em cheio a arte brasileira, transformando, de maneira definitiva e sem volta, a arte e a literatura nacional. O manifesto Pau-Brasil reflete a convulsão das ideias modernistas nesse primeiro momento pós semana de 22.


* Maria Rosane Vale Noronha Desidério é graduanda em Letras Vernáculas - 7º semestre.

quinta-feira, 3 de março de 2016

As Vestes do Vento

Por Danilo Cerqueira*


Quais são estas vestes, Poeta Solidade Lima? De que (i)material elas são feitas? Sendo oriundas do vento, de onde vêm e para onde irão?... As respostas não são fáceis… ou são tão fáceis que não podemos, em função de nosso mundo mediocraticamente desarejável, ver ou entendê-las.

Os ventos de Solidade Lima sopraram. Por meio de palavras no papel, é um movimento que, em nossa leitura, reconstrói a poesia de uma das faces do uni-verso da poética do autor: desconfio que As Vestes do Vento são as palavras, mas a oportuníssima incerteza é do poeta. Sem dúvida, pluralizar é uma tônica nos poemas do livro e da poesia que evola quando os olhos se movimentam sobre as letras: textos, títulos, tempos, estados, previsões, provisões, culturas, disposições anímicas para a matéria e a imatéria retintam as crias do poeta. Arte literária, vivências e incitações ao ser humano que perambula nos caminhos da vida bafejam dos versos. Assim, à leitura, sente-se a palavra dita sob contemplação temporal, laica e chistosa do cotidiano, como o vento que não volta mais e se entrega ao acaso do movimento invisível, mas não insensível ao que nos circunda a existência.

O que há de invisível existe em todos os espaços, e parece que As Vestes do Vento sopra em algumas pistas a respeito delas. Os saberes em linhas e linhas de palavras ao espaço das páginas, que podem ser listados e referenciados desde a primeira leitura do que o vate Lima escreve, entregam-se à palavra poética de maneira enlevar quem os lê para uma viagem pela cultura de certo olhar conjugador: o autor e leitor, do texto e do mundo, estão ao vento. Sem distinção de quaisquer elementos concretos e abstratos, esta poesia em vento, que tudo lê, tudo vê e tudo sente, forma-se em função do movimento de leitura, para depois se independer do ar, como a letra do pensamento. Assim, os poemas do livro refletem o quanto admiravelmente destemida é a perspectiva contingentemente holística do que é lido. A especificidade poética dos poemas, inseparável das palavras em qualquer instantâneo de percepção, incita à questão sobre o que é vida além dos seres e das coisas: As Vestes do Vento trata do cotidiano de um em verso, da relação proferida pelo sopro indistinto de um eu-poético, traje das vozes que o podem declamar. Poemas como “Antoptose do Destino”, “Desespelhando Sonhos”, “Teledetecção Remota”, “Íntimo Ornamento”, “O Cio do Ócio” e “O Inconsciente Chiste” compõem o livro de cantos diversos e telúricos dessa voz poética e ubíqua que é o vento, sem esquecer da visada, do “sabor umbilical” presente mesmo no mar, do poema “Metáfora à Deriva Numa Garrafa”.

As harmonizações entre vento e poesia perambulam em destaque nos poemas e versos do livro de Solidade Lima. As vestes, em suas palavras, são muitas, são várias, mas não são as mesmas para todos; não são facilmente conviviais, porque as pessoas são muitas, os leitores são muitos, suas cabeças... e a cidade destes ventos é, como diz o poeta em “Canto Metropolitano”, infinita. Que também o seja a sua poesia, a vitalidade de seu fazer poético, para ele e para nós.


* Danilo Cerqueira é licenciado em Letras Vernáculas (2010), além de especialista (2012) e mestre (2014) em Estudos Literários, todas graduações pela UEFS. É revisor, professor e membro do conselho editorial da revista Graduando: entre o ser e o saber.


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