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quinta-feira, 3 de março de 2016

As Vestes do Vento

Por Danilo Cerqueira*


Quais são estas vestes, Poeta Solidade Lima? De que (i)material elas são feitas? Sendo oriundas do vento, de onde vêm e para onde irão?... As respostas não são fáceis… ou são tão fáceis que não podemos, em função de nosso mundo mediocraticamente desarejável, ver ou entendê-las.

Os ventos de Solidade Lima sopraram. Por meio de palavras no papel, é um movimento que, em nossa leitura, reconstrói a poesia de uma das faces do uni-verso da poética do autor: desconfio que As Vestes do Vento são as palavras, mas a oportuníssima incerteza é do poeta. Sem dúvida, pluralizar é uma tônica nos poemas do livro e da poesia que evola quando os olhos se movimentam sobre as letras: textos, títulos, tempos, estados, previsões, provisões, culturas, disposições anímicas para a matéria e a imatéria retintam as crias do poeta. Arte literária, vivências e incitações ao ser humano que perambula nos caminhos da vida bafejam dos versos. Assim, à leitura, sente-se a palavra dita sob contemplação temporal, laica e chistosa do cotidiano, como o vento que não volta mais e se entrega ao acaso do movimento invisível, mas não insensível ao que nos circunda a existência.

O que há de invisível existe em todos os espaços, e parece que As Vestes do Vento sopra em algumas pistas a respeito delas. Os saberes em linhas e linhas de palavras ao espaço das páginas, que podem ser listados e referenciados desde a primeira leitura do que o vate Lima escreve, entregam-se à palavra poética de maneira enlevar quem os lê para uma viagem pela cultura de certo olhar conjugador: o autor e leitor, do texto e do mundo, estão ao vento. Sem distinção de quaisquer elementos concretos e abstratos, esta poesia em vento, que tudo lê, tudo vê e tudo sente, forma-se em função do movimento de leitura, para depois se independer do ar, como a letra do pensamento. Assim, os poemas do livro refletem o quanto admiravelmente destemida é a perspectiva contingentemente holística do que é lido. A especificidade poética dos poemas, inseparável das palavras em qualquer instantâneo de percepção, incita à questão sobre o que é vida além dos seres e das coisas: As Vestes do Vento trata do cotidiano de um em verso, da relação proferida pelo sopro indistinto de um eu-poético, traje das vozes que o podem declamar. Poemas como “Antoptose do Destino”, “Desespelhando Sonhos”, “Teledetecção Remota”, “Íntimo Ornamento”, “O Cio do Ócio” e “O Inconsciente Chiste” compõem o livro de cantos diversos e telúricos dessa voz poética e ubíqua que é o vento, sem esquecer da visada, do “sabor umbilical” presente mesmo no mar, do poema “Metáfora à Deriva Numa Garrafa”.

As harmonizações entre vento e poesia perambulam em destaque nos poemas e versos do livro de Solidade Lima. As vestes, em suas palavras, são muitas, são várias, mas não são as mesmas para todos; não são facilmente conviviais, porque as pessoas são muitas, os leitores são muitos, suas cabeças... e a cidade destes ventos é, como diz o poeta em “Canto Metropolitano”, infinita. Que também o seja a sua poesia, a vitalidade de seu fazer poético, para ele e para nós.


* Danilo Cerqueira é licenciado em Letras Vernáculas (2010), além de especialista (2012) e mestre (2014) em Estudos Literários, todas graduações pela UEFS. É revisor, professor e membro do conselho editorial da revista Graduando: entre o ser e o saber.


Um comentário:

  1. Grande texto, Danilo! Parabéns... Fina tessitura de palavras envolta em ventos. As Vestes da consciência.

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