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segunda-feira, 9 de junho de 2014

TERÇA-FEIRA

* Por Carise Suane de Jesus Santos


Um dia normal até aquele instante. O ônibus quase saindo do terminal, ganhando força para fazer mais uma trajetória. Alguém pede para que espere um pouco. Uma senhora quer entrar. Ela adentra e alguém se levanta, dando-lhe o lugar. Eu a chamo “Aqui, sente-se aqui”. Meus olhos captam mais alguém naquele episódio que estava apenas começando. Um menino que aparentava ter uns seis anos. Roupas alegres, boné, uma carteira debaixo dos seus braços, sacolas nas mãos, um documento de identidade, e um olhar atencioso para alguém que estava ao meu lado. Aquela Senhora. Percebi imediatamente que aquele RG e aquela carteira não eram seus, eram dela. Talvez você não esteja entendendo. Perdoou-te por não sentir o coração apertar. Algumas coisas precisam ser vividas para serem compreendidas.

Aquele menino me deu a oportunidade de vivenciar uma das cenas mais bonitas da minha vida, até hoje. Aquela criatura exalava bondade. Eu queria chegar logo ao meu destino final. Não aguentava mais ficar observando tanta gentileza. No fundo eu sentia vergonha. Eu queria ser como ele. Os meus olhos não seguraram as lágrimas. Chorei como uma criança. 

Eu sorri para ele. Ele correspondeu. Será que ele sabia que eu o admirava tanto? Será que percebeu, nos meus olhos cheios de água, que ele era único e especial? Será que pode compreender que ele era um diferencial nessa sociedade suja e perdida? Ele não sabia e isso não importava nem um pouco.

Passou algum tempo e aquela criança acertou meu coração com um golpe. Foi fatal. Ele apanhou uma maçã na sacola, entregou à avó, tomou-a de volta, mordeu um pedaço e entregou-lhe novamente. Entendi. Ela não conseguia morder a fruta sozinha. Eu queria descer daquele ônibus logo. Pareeeeem! Preciso sair. E ele continuava sorrindo, como se o que ele fez tivesse sido a coisa mais natural do mundo. E foi.

Por quê? Por que o que deveria ser natural agora é tido como algo surpreendente? Por que tanta bondade nos assusta? Acredito que nós, com nossas dores, guerras, conflitos e egoísmos, esquecemo-nos de ser bons. Esquecemo-nos de buscar o amor ao próximo. Então, o que era para ser natural é atração particular num ônibus lotado. Feita por alguém que não encena, mas é a bondade, vive o amor e mesmo sem entender e saber me ensinou coisas preciosas.

Aconteceram muitas coisas até eu descer no meu ponto. Relutava comigo mesma, queria dizer algo para ele. Queria que se lembrasse de mim. Decidi então perguntar onde eles iriam descer. Responderam-me. Mas, não era isso que o meu coração e a minha mente queriam dizer. Então, nos últimos instantes da minha presença naquele veículo, eu disse: Já vou. Deus te abençoe. Disse, olhando para aquele ser pequenino. Eram para aquele ser grandioso as minhas palavras.

Oro ao Senhor para que aquele rapazinho se torne um homem com os mesmos valores que possui. Sei que possuirá.


Carise Suane de Jesus Santos cursa o quarto semestre de Letras Vernáculas na Uefs.

segunda-feira, 2 de junho de 2014

SOBRE SABER AMAR

* Por Ilana Benne Falcão Maia


Certa feita tive o interesse em pesquisar e escrever sobre o amor. Sabemos que as relações amorosas mudaram e mudam ao longo do tempo. Desde a Idade Média até os dias atuais, a instituição do casamento e o amor são vistos de diferentes formas devido às mudanças e movimentos das sociedades, o que não me surpreendeu até então. Foi aí que me deparei com a expressão “amor líquido” se referindo aos laços humanos do homem moderno como algo frágil, o que faz todo sentido. O amor moderno tornou-se líquido, segundo Bauman (2004) “as relações estão frouxas". Os desejos mudaram, conectar-se a alguém pode ser fácil, o difícil é justamente o contrário, romper esse laço é doloroso. O homem moderno teme a dor, fazendo assim as relações ficarem vazias, mantendo assim a sua liberdade.

Talvez os motivos dessa diluição do sentimento amoroso sejam por conta dos desejos urgentes, das intenções que mudaram e da constante busca do sentido da vida. Inúmeras dúvidas permeiam as cabeças de homens e mulheres do século XXI, e talvez nenhuma certeza. Perdeu-se o encanto do “amor da alma da cintura para cima e amor do corpo da cintura para baixo” (Garcia Márquez), vivemos o mundo da pluralidade, do efêmero, em que instituições como o casamento formal estão tendo que se adaptar às condições de mudança social. Nesse processo de mudança das relações amorosas, a intimidade tornou-se flexível devido à grande aceitação das relações sexuais pré-nupciais, à infidelidade, à adaptação religiosa a essas relações, apesar da religião ainda manter suas ideologias e resistências a respeito do casamento. Enfim, em tudo ou quase tudo os laços amorosos se diferenciam daqueles das sociedades arcaicas, em que o amor era algo crescente e fazia parte da adaptação do casal, e podia existir no leito matrimonial ou não; hoje é pré-requisito para o início da relação que começa ardente mas costuma acabar com o tempo, a partir do momento que os interesses mudam.

Com a flexibilidade do mundo moderno, todas as configurações de amor são aceitáveis, o que preocupa é que isto se perca, o sentimento se torne tão líquido que evapore. Enquanto pisamos na incerteza do que é amar e ser amado, os laços humanos continuarão sendo frágeis.


* Ilana Benne Falcão Maia é graduanda do quarto semestre de Letras Vernáculas na Uefs.

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