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segunda-feira, 2 de março de 2015

UMA QUESTÃO DE IDENTIDADE

Por Maria Rosane Vale Noronha Desidério *


Supõe-se que todas as nações do mundo estão deitadas sobre o berço esplendido de sua história. E, este berço é, sem dúvida, também o alicerce de sua identidade, de sua particularidade no meio universal. Mas quando os alicerces históricos de uma nação são apagados como definir seu conceito de identidade?

Esta foi, certamente, uma pergunta muito presente entre os intelectuais do Brasil. Como identificar a identidade de uma nação cujo passado foi apagado? Os Românticos, influenciados pelos ideais iluministas, buscavam as respostas entre os primeiros habitantes das terras brasileiras – os índios. No entanto, a cultura indígena há muito que havia sido suplantada pela europeia. Os Românticos, então, idealizaram o índio na tentativa de constitui-lo como herói nacional, como o representante genuíno da nova pátria.

Transformar o índio em herói da nova pátria seria uma saída extraordinária para uma nação sem história, sem passado, mas a solução se mostrou conflituosa. E, isto ocorreu porque primeiro, a figura indígena foi retratada sob aspectos que não lhe era próprio. O índio herói possuía um caráter europeizado, cristianizado, imbuído de uma profunda inocência, coragem e generosidade, incapaz de atitudes cruéis e profundamente fiel ao amor e ao cuidado com o branco. Lembremo-nos de Peri devotado ao amor por Ceci.

Em segundo lugar, buscava-se alicerçar o Brasil sobre uma cultura que fora esmagada pelo Outro europeu. Uma cultura que desde o princípio foi subjugada inferior pelo olhar europeu. Ao ler Iracema de José de Alencar, observamos o abafamento da cultura indígena para que florescesse a do Outro. A metáfora de Iracema que abandona suas raízes para devotar-se ao amor do europeu Martim e morre solitária para dá a vida ao filho – fruto da dominação do Outro, demonstra essa visão de que era necessário, para que a cultura europeia florescesse, a morte sacrificial da indígena.

Portanto, é profundamente complexo construir a ideia de identidade nacional, alicerçado ao índio. Porque este não era exposto, de fato, como ele era. Logo, a identidade brasileira não possuía raízes sólidas. O que havia era uma idealização conflituosa e pouco palpável. 

A busca pela temática indígena fora, certamente, motivada pela necessidade de se libertar das influencias portuguesas. Era preciso encontrar as raízes, mas estas já não existiam, de fato. Esta tentativa de livrar-se de Portugal aproximou os escritores brasileiros da França. Estes vislumbraram o Brasil e sua natureza exuberante e imensa, enquanto contemplavam o rio cena. A literatura brasileira ainda estava impregnada pelo olhar europeu. Não havia como não estar, tendo em vista, que os nossos escritores estavam tomados pelo Outro – ainda que a princípio não percebam a força umbilical de sua ligação com o outro estrangeiro. 

É interessante observarmos que todo o processo de construção do ideário de Pátria e da própria literatura no Romantismo não levou em conta a matriz africana. Isso ocorreu porque o negro também era visualizado como o Outro. É este outro estava agravado pela condição de escravo. Desta forma, os escritores Românticos rejeitaram os Portugueses e os africanos, mas agarraram-se a ideologia iluminista da França. E, assim, a França diferentemente de Portugal, conquistou o Brasil de forma diferente. Conquistou o Brasil de forma mais poderosa – pelo pensamento, pela palavra. 

A literatura nacional, portanto, não possuía um caráter efetivamente nacional. Estava caminhando a passos tímidos em busca de encontrar o seu caráter particular, universal. Mas esta tarefa seria e permanece bastante complexa.


Maria Rosane Vale Noronha Desidério é aluna do 6º semestre do curso Letras Vernáculas pela UEFS.

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