* Por Danilo Cerqueira
Há mais ou menos um ano, um colega (de Letras) de escrita colocou um livro em minha
mão: Memórias de um Porteiro. Esse
livro apresenta a trajetória de um jovem porteiro (mas também portador) que,
depois e muitos problemas de ordem social, profissional e amorosa na vida,
enfrentados desde a infância, encontra uma garota e vive uma história de
amor... E a confessa para nós.
Eu disse, entusiasmado com a publicação, que faria um texto para
divulgar o trabalho no blog da revista (um exercício de crítica-resumo-resenha
literária).
Cito algumas passagens do livro que me chamaram a atenção:
Esse mistério é tão extenso que chega à eternidade. E nós, poetas do
amor, vamos permitindo que ele se apresente de várias formas nos vários
indivíduos que vivem mergulhados nesse bosque florido que é o amor. (p. 24).
[...] a vida é uma mala que arrumamos dia após dia [...]. (p. 31).
- E eu vou enlatando tudo que absorvo, do nascer ao pôr do sol. (p. 75)
Enquanto elas acham isso de mim, vou tecendo minhas virtudes em meus
sonhos e fico encoberto por elas. A minha história servirá de exemplo para aqueles
que procuram agir com responsabilidade e amor. Neste momento a morte não faz
nenhum sentido, e sonho em chegar aos oitocentos anos. A ciência se multiplicará,
e descobrirá a fórmula o rejuvenescimento. Com isso regenerando e gerando todas
as células do nosso corpo. Assim terei muito tempo para expressar o meu
sentimento, minha alma, meu ser ignorante.
São mais de quinze anos de construção, e se estenderá à eternidade.
Quando os sonhos cessarem aqui, os celestiais continuarão premiando minha alma
transformada. E enquanto a eternidade não chega, vou edificando minhas palavras
em versos, que por sua vez edificam uma história. (p. 76).
Por dez anos andei entre os devaneios de adolescentes, nesse caminho
que eu parecia estar perdido. A poesia que foi o meu alimento quase sempre, em
alguns momentos era só o que eu tinha de companhia. Ver tanto e casa instante
sentir-me tão longe de viver uma história que fizesse parte de tudo aquilo. Todos
passavam por mim, mas só alguns faziam parte do meu viver, que avassalava toda
a minha vida. (p. 89).
Gostaria de destacar alguns pontos do romance:
* Personagem e narrador se confundem com o porteiro (ou seria portador)
do(s) adolescente(s), coerente com o texto apresentado ao leitor;
* O uso do gênero carta no romance marca de maneira sensível o perfil da
maioria das personagens e do porteiro, intensificando o tom confessional, marca
de todo o texto;
* O bom capítulo VI, com o retrato escrito do narrador-personagem e da
proposta tramada pelo texto em função da ambientação e construção das
personagens.
O livro representa uma fase. Talvez seja lido apenas uma vez, mas lido
e vivido (vívido, vividamente) em alguma fase da vida. A trajetória segue (e
certamente escreve) talvez em pautas de uma folha de almaço (popularmente e notadamente conhecido como papel pautado), tipicamente
utilizada na infância ou adolescência, na escola, tal como a principal ambientação.
As aventuras descritas com puerilidade e exacerbação, entre a aspiração à técnica
e a insurgência da emoção, deixam, no tempo de leitura, o tempo da adolescência,
com seus momentos intensos a saborosos, com inocência e altruísmo infantis, e até
piegas, mas exatamente na medida em que o conjunto do texto parece exigir para
sua coerência romântica, de origem e de aprofundamento no mundo interior dos
sentimentos, de seu típico alheamento da realidade externa à lógica e ao
pragmatismo contemporâneos. Assim, o enfoque na origem, seja ela existencial,
religiosa, espiritual, social ou sentimental, é fomentadora de um efeito de
leitura que, se é fácil de ser esquecido e até criticado negativamente, pode ser reconsiderado com um despretensioso acesso às próprias lembranças.
Parabéns a Denival... Um livro que, como este texto, foi (semente e)
fruto de lembranças, para ser vivido, emocionado, lembrado, pensado, escrito e
lido - em ordem nunca essencial para o leitor.
*Danilo Cerqueira cursa o Mestrado em Estudos Literários na UEFS.